Ensinar e Aprender
A escolha da melhor forma de ensinar e de aprender depende do seu ajustamento circunstancial e contextual. São as circunstâncias e o contexto que determinam a escolha dos métodos, técnicas e procedimentos que melhor se ajustarem ao processo de ensinar e de aprender. Por sua vez, é este ajustamento que determina, em larga medida, o sucesso/insucesso dos processos educativos e pedagógicos. Neste sentido, do mesmo modo que quem ensina recorre aos métodos e técnicas julgados mais eficazes, eficientes e oportunos na sua função de tornar compreensível o que é ensinado, também quem aprende faz uso dos processos julgados também mais eficazes, eficientes e oportunos para compreender o que aprende, de modo a assimilá-lo como saber, como conhecimento.
No que à escola diz respeito, a definição do que ela deve ensinar, i.é, a identificação das finalidades e desígnios formativos e educacionais é competência do Estado. A salvaguarda do “saber comum” e da identidade cultural assim o exige. A sua operacionalização, i.é, a escolha dos melhores processos de transmiti-los e ensiná-los e das melhores condições para aprender deve ser competência da escola.
É aqui, justamente neste equilíbrio entre o que ensinar e aprender e como ensinar e aprender que se joga todo o processo educacional e o sentido da autonomia e do projecto. É aqui que se joga o equilíbrio entre a autoridade e a autonomia. É aqui, enfim que se ganha ou se perde a luta contra a barbárie e o vazio , como Steiner afirmou, referindo-se ao ensino secundário (2004: 75).
Deste modo, a “autonomia autêntica” advém do reconhecimento, por parte do Estado, da competência e da capacidade das escolas escolherem e operacionalizarem os processos mais adequados ao cumprimento dos objectivos e finalidades, identificados pelos órgãos competentes que tutelam a educação como essenciais ao nosso viver comum e à educação de todos, com todos e para todos.
São as escolas e os professores que melhor poderão mobilizar os saberes e capacidades com vista à educação das crianças e jovens a que se destina. São as escolas e os professores que poderão dar resposta adequada e oportuna à imprevisibilidade e imponderabilidade das circunstâncias e desafios com que o ensinar e o aprender se confrontam, tanto mais quanto a escola pretender assumir-se como mobilizadora da imprevisibilidade dos saberes que se fazem ao seu redor, disponibilizados pela TV, pela Internet e/ou por grupos e comunidades étnicas, culturais e raciais.
São as escolas, na sua especificidade e diferença, assumida a sua insubstituível função educativa, alicerçada nos valores que nos permitem viver bem uns com os outros, contribuindo para a dignificação interpessoal dos envolvidos no processo de ensinar e de aprender, que, no processo educativo, podem fazer da diferença uma categoria fundamental do tempo e do espaço que constituem a nosso modo humano de ser e do outro a referência da educação inclusiva. A liberdade, o respeito, a solidariedade e a tolerância são os pilares deste edifício ético que se constrói na mobilização intersubjectiva de modos de ser, pensar, dizer e fazer que, na sua diversidade, mutuamente se justificam na dinâmica dialógica que identifica o processo educativo e pedagógico.
Ora, este reconhecimento tornará mais eficaz a acção do Estado perante, por um lado, a progressiva complexidade que caracteriza as sociedades contemporâneas e a escola e, por outro, a necessidade de conciliar o respeito pela diferença com as finalidades e objectivos comuns. Esta conciliação só será possível “com o reforço simultâneo da autonomia das escolas e das formas democráticas de participação e decisão” (Barroso, idem: 44). “Só assim será possível, conclui, recorrendo a Tyack e Cuban, ‘estabelecer um acordo sobre uma base suficientemente generosa, atractiva e plausível que possa unificar os cidadãos no apoio à escola pública’, ’uma necessidade crucial do nosso tempo’”(Idem: 45).
Neste sentido, salientam-se, doze anos depois, os “sete princípios” que João Barroso considera norteadores da autonomia das escolas que possa constituir motor de inovação e “um meio de as escolas prestarem em melhores condições o serviço público de educação” (Ibidem) .
O decreto-lei 75/2008 de 22 de Abril representa um passo importante no reconhecimento da importância das escolas na promoção da educação, do saber em íntima articulação com a comunidade em que se insere. Assim vá além da “retórica política” e da pura “ficção” e se transforme no motor de uma estimulante utopia.
Bibliografia referenciada
AAVV 2006 A autonomia das escolas, Lisboa, F. C. Gulbenkian
BARROSO, João (2006) “A autonomia das escolas: retórica, instrumento e modo de regulação da acção política”, in AAVV (2006) A autonomia das escolas, Lisboa, F.C.Gulbenkian, pp 23-48
BARROSO, João (2004) “A autonomia das escolas: uma ficção necessária” in Revista Portuguesa de Educação, 2004, 17(2), pp 49-83
CARVALHO, Adalberto (1994) Utopia e educação, Porto, Porto Ed.
CARVALHO, Adalberto et alt (1993) A construção do projecto de escola, Porto, Porto ed
CARVALHO, Rómulo (1986) História do Ensino em Portugal, Lisboa, F. C. Gulbenkian,
DAMAS, José A (1997) A Educação como comunicação normativa, Penafiel, ISP
FOUCAULT, Michel (1975) Surveiller et punir, Paris, Gallimard
GIL, Fernando (1979) « Disciplinas : Invenção, transmissão, habitus", in CARRILHO, Manuel M (dir.) (1979) História e prática das ciências, Lisboa, A Regra do Jogo, pp. 239-321
GOMES, Joaquim F. (1984) Estudos de História e de Pedagogia, Coimbra, Livraria Almedina
LIMA, Licínio C. (1992) A escola como organização e a participação na organização escolar, Braga, Un. Minho,
STEINER, G., LADJALI, C (2004) Elogio da Transmissão, Lisboa, D. Quixote
TORGAL, Luis R. (1993) "A instrução Pública" in História de Portugal, Quinto Volume, 609-652, Lisboa, Círculo de Leitores
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